quarta-feira, 30 de janeiro de 2019

SIM. SOU MÃE


Avanilda Torres
Sim, fui mãe de unhas rentes medrosa de arranhar os pequenos
A quem dei a luz das letras
E outros maiores a quem frívola seduzi com as artimanhas do literário
Usando caras e bocas, pernas e coração em transe desvairado
Sim, fui mãe em cada mês, em cada ano que bajulei a endometriose
Com afagos médicos e amorosos
Em vão esperei o filho fruto do encontro apaixonado
Achei depois que seria simples extrair um útero doente
Alívio como numa dor de dente
Fui animada, perfumada, intocada.
Mas o sangue preso cobrou um preço
Fugiu a vida ficou a dor
Da falta, do poder, do amor.
Ondulei os cabelos à Gal Costa
Enfrentei as saias, aderi às risadas
O mundo se encolheu criança
Não mais valia a música, a dança
A fala me salvou na inteireza do divã.
Sim, sou mãe em todos os alunos que toquei
Na suplência do que experimentei
Laços bem dados em corações suaves
Trocas sutis, seguras e saudáveis.



Nenhum comentário:

Postar um comentário